A Água Milagrosa de Santa Cecília: História de Privatização e Exploração de um Bem Público
Descoberta a história da privatização das fontes medicinais de Santa Cecília, em São Paulo, que passaram de bem público a negócio lucrativo no século XIX. Um caso histórico que ilustra a mercantilização dos recursos naturais e o impacto do capitalismo sobre bens comuns.
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Antiga fonte de água mineral de Santa Cecília, São Paulo, hoje desaparecida sob a urbanização
A Mercantilização de uma Fonte Natural no Coração de São Paulo
No atual bairro de Santa Cecília, zona central de São Paulo, onde hoje vemos apenas betão e asfalto, existiu outrora um verdadeiro tesouro público: fontes naturais de água mineral com propriedades medicinais comprovadas. Esta história, que remonta ao século XVIII, revela como um bem comum foi gradualmente transformado em mercadoria para benefício privado.
Do Bem Comum ao Lucro Privado
O investigador Lincoln Paiva, através de uma minuciosa pesquisa nos arquivos históricos, revelou como estas águas, inicialmente de acesso livre à população, foram apropriadas por interesses privados.
"Acreditava-se que a água era milagrosa e tinha poderes para tratar doenças do estômago, fígado e problemas de pele, comuns na época"
A Cientificação como Instrumento de Privatização
Em 1867, iniciou-se a comercialização da água em barris. Trinta anos depois, o médico Domingos Jaguaribe, numa manobra que misturava ciência e oportunidade de negócio, enviou amostras para análise no Instituto Pasteur em Paris.
A confirmação científica das propriedades medicinais serviu como justificativa para a completa privatização do recurso. Jaguaribe estabeleceu um instituto médico e começou a cobrar valores significativos pelos tratamentos:
- Banho simples: 1.000 réis
- Banho de cachoeira: 800 réis
- Banhos medicamentosos: 5.000 réis
A Mercantilização Total: Nascimento da Vitalis
A transformação final veio com o engarrafamento e comercialização da água sob a marca Vitalis, atingindo uma produção de 10.000 litros diários. O que antes era um recurso natural acessível a todos tornou-se um produto de luxo, consumido pela elite, incluindo o Barão do Rio Branco.
O Legado Perdido
Hoje, as fontes de Santa Cecília já não existem mais, sepultadas sob o desenvolvimento urbano desenfreado. Esta história serve como exemplo da progressiva privatização dos recursos naturais e da transformação de bens públicos em mercadorias de acesso restrito.
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